segunda-feira, 28 de setembro de 2015

J. J. Veiga mais uma vez


Em março do corrente ano este Louco registrou o que denominou O renascimento de José J. Veiga, com o relançamento de Os cavalinhos de Platiplanto, pela Companhia das Letras (2015). (http://loucoporcachorros.blogspot.com.br/2015/03/o-renascimento-de-jose-j-veiga.html)
Depois veio A hora dos ruminantes, pela mesma editora. E agora surge o excelente romance Sombras de reis barbudos.
O aparecimento do livro ocorreu originalmente em plena efervescência da literatura latino-americana, dominada pelo realismo fantástico dos anos 70. Veiga antecipou-se a este movimento, segundo Antonio Candido, com Os cavalinhos de Platiplanto (1959).
            Há quem considere Sombras de reis barbudos o melhor romance de Veiga. De fato, a linguagem é muito bem acabada, na voz de um narrador adolescente de 16 anos de idade, sempre deslocado em meio a adultos assustados. Os conflitos familiares e sociais estão presentes ao longo do livro, trazendo a lembrança de Borges, Garcia Marques e até Kafka.
            Lá pelo meio da narrativa surge um capítulo espetacular, intitulado Pausa para um mágico, metáfora com o objetivo de ludibriar a plateia e entreter o leitor. Reproduzo aqui um trecho do capítulo:

“É difícil explicar, mas no momento em que a cortina se abriu senti qualquer coisa diferente no ar, assim um arrepio vindo não sei se de dentro ou de fora de mim, uma mudança na qualidade dos sons, como se meus ouvidos tivessem acabado de passar por uma limpeza sensacional, e sei que todo mundo sentiu a mesma coisa. O homem que estava no palco de braços abertos para a plateia – o mesmo que eu tinha visto dias antes na sala de espera – era novamente o Grande Uzk dos cartazes.
... Ninguém se mexia, ninguém falava, e acho que se ele ficasse naquela posição de cruz até o fim do espetáculo ninguém ia reclamar.
... Naquela noite, e nas outras, o Grande Uzk fez o que quis, virou o mundo pelo avesso na nossa frente, desmanchou-o e montou de novo de maneira diferente, nós vendo tudo e não acreditando, ainda hoje não acredito.”

            Redescobrir um autor como J. J. Veiga nos dias de hoje é uma felicidade inspiradora para a literatura brasileira contemporânea.


Um comentário:

  1. Os comentários do louco dão sempre vontade de ir aos livros. Pena que o mortal comum não consegue acompanhar seu ritmo de leituras.

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